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Propriedade privada em áreas de proteção ambiental: veja o que pode acontecer

Áreas de proteção ambiental

As Áreas de Proteção Ambiental-APAs são espaços especialmente protegidos pelas normas ambientais. Segundo a lei que traz sua definição ela consiste em uma área em geral extensa, com certo grau de ocupação humana, dotada de atributos abióticos, bióticos, estéticos ou culturais especialmente importantes para a qualidade de vida e o bem-estar das populações humanas, e tem como objetivos básicos proteger a diversidade biológica, disciplinar o processo de ocupação e assegurar a sustentabilidade do uso dos recursos naturais.

Esse conceito pode ser traduzido como uma área que congrega o desenvolvimento econômico e social, porém, com relevância acima da média para o uso racional e sustentável dos recursos naturais e a manutenção da qualidade de vida local.

As APAs, portanto, permitem a ocupação humana, mas com prestígio elevado das boas práticas socioambientais. Limitações de quantidade e forma de crescimento para evitar a degradação do meio ambiente que, em alguma medida, é inevitável. 

A APA pretende a ocupação humana com conservação da natureza e uso sustentável dos recursos naturais.

Importante ressaltar que a APA é uma unidade de conservação de uso sustentável. Isso significa que ela integra o Sistema Nacional de Unidades de Conservação-SNUC de que trata a Lei nº 9.985/2000.

Como unidade de conservação, a APA se diferencia por permitir a ocupação humana e a propriedade privada no seu território e pela ausência de zonas de amortecimento e corredores ecológicos.

Propriedade privada em área de proteção ambiental

A permissão para a existência de propriedade privadas se mostra na própria lei que traz sua definição. 

Dentro do SNUC a existência de propriedade privada nas unidades de conservação é exceção. Por isso, a APA é exceção dentre as unidades de conservação por permitir a convivência da propriedade privada e seus atributos com o regime jurídico especial que a unidade de conservação atrai.

Os direitos envolvidos

Direitos do dono x direitos ambientais 

A propriedade se exterioriza com algumas manifestações, características que servem à sua definição e a própria análise dos direitos que garantem. Contudo, a propriedade privada, assim como todos os direitos em estados de direito, não tem sua fruição irrestrita, sem limitações, de forma absoluta.

Basta analisar o direito de construir em terreno urbano para perceber que a liberdade que o direito de propriedade confere é limitado pelas normas urbanísticas da localidade do imóvel.

Isso num primeiro momento, outras limitações estão tão enraizadas no ideário coletivo que dificilmente alguém as percebe. O silêncio após as vinte e duas horas; as janelas na divisa do terreno; dentre tantas outras limitações ao uso da propriedade que por conviverem com a sociedade há tanto tempo já não são identificadas e normalmente são tratadas como naturais.

Os direitos de dono, portanto, já encontram limitações usuais. A ampliação da perspectiva ambiental tanto do direito urbanístico quanto para áreas rurais estabeleceu algumas normas extras de convivência coletiva. 

Essa contraposição é apenas aparente e, tal qual para todos direitos que parecem se eliminar, a melhor interpretação é aquela que permite a convivência dos direitos. Não há anulação de um direito para que o outro seja usufruído. O que ocorre é um balanceamento com uma limitação maior de um em prol de outro para um ganho geral maior.

Especialmente em APA, os direitos de dono são limitados pelo plano de manejo da área. O plano de manejo é um documento técnico mediante o qual, com fundamento nos objetivos gerais de uma unidade de conservação, se estabelece o seu zoneamento e as normas que devem presidir o uso da área e o manejo dos recursos naturais, inclusive a implantação das estruturas físicas necessárias à gestão da unidade (art. 2º, XVII, da Lei nº9.985/2000)

O artigo 225 da Constituição Federal de 1988

Ao analisar o texto da Constituição Federal, fica claro o dever de preservação e recuperação ambiental. 

A Constituição determina ao Poder Público a preservação e restauração dos processos ecológicos essenciais e o manejo de espécies e ecossistemas. Essa construção constitucional é a exemplificação normativa do que o Poder Público precisa minimamente fazer para possibilitar o direito que concede.

O mesmo artigo impõe a definição de espaços territoriais e o que dentro desses espaços devem gozar de proteção especial e as limitações, inclusive administrativas, para alteração e supressão desses espaços. Veda ainda, qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que serviram de justificativa à sua proteção;         

Justamente aí reside o fundamento constitucional da APA. Um espaço territorial com atributos que justificam uma proteção especial para garantir o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.

O que pode acontecer com propriedade privada em áreas de proteção ambiental

O que pode acontecer

A propriedade privada pode anteceder a criação da APA ou ser adquirida após a criação da unidade de conservação.

A propriedade privada que sofre limitações com a criação da APA pode seguir dois caminhos a depender das restrições impostas. Caso as restrições sejam de tal monta que inviabilizem os direitos inerentes à propriedade (uso e gozo) a ponto de retirar o valor econômico da propriedade, é cabível a indenização do proprietário. Esse não é o caminho usual quando se está tratando de APA, contudo, em casos extremos, quando a propriedade se torna inútil ao proprietário de forma a esvaziar seu valor patrimonial, é possível interpretação de cabimento da desapropriação indireta.

Por outro lado, caso as limitações impeçam algumas atividades e formas de uso que não se consubstanciem em restrições totais dos direitos do proprietário, este deverá conviver com esses limites e adequar o uso ao estabelecido no plano de manejo e regulamentos da área

Ambas as situações tratam de criação de APA depois da aquisição de propriedade.

Quando a propriedade é adquirida após a criação da unidade de conservação, uma vez que a APA é dotada de publicidade, o adquirente já conhece as limitações impostas para o local e não poderá exigir indenização. Isso porque não sofreu uma limitação ao direito de propriedade, já adquiriu uma propriedade que sabia ou deveria saber continha restrições.

O descumprimento das regras aplicáveis à APA pelo proprietário pode se constituir em ilícito administrativo, civil e até mesmo criminal a depender da conduta e das circunstâncias. 

A título de exemplo uma obra irregular pode ter sua demolição determinada pela autoridade ambiental. 

Decisões favoráveis ao público

Os tribunais brasileiros já se decidiram a respeito da propriedade privada em área de proteção ambiental, como por exemplo:

REsp 1771981 / SP

ADMINISTRATIVO E AMBIENTAL. RECURSO SUBMETIDO AO ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 2/STJ. ATIVIDADE DE MINERAÇÃO EM ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL (APA DE JUNDIAÍ/SP). LICENCIAMENTO ANULADO POR MEIO DE DECISÃO JUDICIAL. PEDIDO ADMINISTRATIVO DE REGULARIZAÇÃO INDEFERIDO EM RAZÃO DE VEDAÇÃO LEGAL DE MINERAÇÃO EM ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL. PRETENSÃO DE ANULAÇÃO DESSA DECISÃO ADMINISTRATIVA PARA A RETOMADA DO PROCESSO DE LICENCIAMENTO, COM APRESENTAÇÃO DE EIA/RIMA.

EDcl no REsp 1768207 / SP

PROCESSUAL CIVIL. AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. AMBIENTAL. OCUPAÇÃO E CONSTRUÇÃO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. HIPÓTESE QUE NÃO SE AMOLDA A QUAISQUER DAS SITUAÇÕES QUE AUTORIZAM A EXCEPCIONAL INTERVENÇÃO NESSE ESPAÇO TERRITORIAL ESPECIALMENTE PROTEGIDO. IMPERIOSA A DEMOLIÇÃO DA CONSTRUÇÃO NA ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. PRECEDENTES. A REPARAÇÃO INTEGRAL DO DANO AMBIENTAL ENVOLVE, ALÉM DAS MEDIDAS PARA SUA RECUPERAÇÃO, A COMPENSAÇÃO PELO PERÍODO EM QUE FORAM DESRESPEITADAS AS NORMAS AMBIENTAIS. PROTEÇÃO DAS ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE PARA AS PRESENTES E FUTURAS GERAÇÕES. ALEGAÇÕES DE VÍCIOS NO ACÓRDÃO. INEXISTENTES.

I – Na origem, trata-se de ação civil pública, objetivando a demolição de edificação, bem como proceder a recuperação ambiental do local, dada a supressão de vegetação nativa pela construção de uma casa de veraneio, em topo de moro da APA de Sapucaí Mirim, considerada Zona de Vida Silvestre, sem que tal empreendimento tivesse utilidade pública ou interesse social para fins de saúde pública.

II – Na sentença, julgaram-se parcialmente os pedidos para condenar solidariamente os réus nas obrigações de (a) demolir todas as construções situadas na Zona de Vida Silvestre do imóvel no prazo de sessenta dias do trânsito em julgado da sentença, sob pena de multa diária, limitada a 60 dias, sem prejuízo de se determinar providências que assegurem o resultado prático equivalente; (b) recompor a vegetação nativa, conforme o PRAD (projeto de recuperação da área degradada), aprovado pela CBRN, que deverá ser apresentado no prazo de 30 dias do trânsito em julgado; (c) pagar pelos danos ambientas praticados, imediatos e contínuos, apurados na perícia judicial, com atualização monetária desde a data da perícia complementar e juros de mora de 1% ao mês a contar da citação, com exceção das Fazendas, cujo pagamento se faz por precatórios.

Documentos necessários para propriedades privadas em área de proteção

A propriedade privada em áreas de proteção precisa reunir os documentos usuais para o registro da propriedade

O primeiro passo é a matrícula no registro de imóveis. A matrícula irá descrever minuciosamente as características do imóvel, suas confrontações e as limitações gravadas.

Além da matrícula, indispensável a qualquer imóvel, a propriedade privada em área de proteção deve conhecer o plano de manejo da APA que integra. Esse documento irá estabelecer todos os limites e formas de uso da propriedade. 

Através do zoneamento ambiental são definidas áreas que constituirão zonas regidas por normas com maiores ou menores restrições de uso. 

O que fazer em caso de propriedade privada em área de proteção

Caso a propriedade seja anterior a criação da APA é preciso verificar se a unidade inviabiliza a propriedade. Se torna a propriedade inútil é possível pleitear indenização por desapropriação indireta.

Caso o interesse seja adquirir uma propriedade em APA é importante conhecer o plano de manejo e posicionar a propriedade no zoneamento desse plano para saber quais as limitações que a propriedade sofre.

Importante também se familiarizar com o Conselho Consultivo da APA. Esse é um instrumento de participação social na gestão da unidade de conservação.

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